Na primeira parte deste breve ensaio abordamos a objeção bíblica no que diz respeito a reflexão filosófica. Agora vejamos na parte II: Objeção Teológica.
Tertuliano
Todas as críticas da interação cristianismo-filosofia parecem remontar a Tertuliano (séc. I-II), advogado romano do século III que se converteu ao cristianismo. É bem provável que ele tenha sido o primeiro a questionar o papel da filosofia para a compreensão dos conteúdos evangélicos e também o primeiro a negar aos cristãos o acesso a herança intelectual e cultural para propósitos evangelísticos. Wolfhart Pannenberg (2008, p.18) confirma este dado:
"A concepção de que a doutrina cristã nada tem haver com a filosofia, e que toda ligação com o pensar filosófico seria paga com o preço de sua autenticidade como teologia da revelação, reiteradamente se tem reportado a Tertuliano como seu ancestral ".
Sua famosa pergunta retórica ecoa até hoje: “Que relação há entre Atenas e Jerusalém? Que importância tem a Academia de Platão tem para a igreja?” A resposta parece ser clara para Tertuliano: o cristianismo deve se manter distante da reflexão filosófica não importa quão louvável sejam os motivos.
Porém, é no mínimo estranho Tertuliano ter questionado o papel da filosofia, uma vez que ele era alguém versado no conhecimento , apologista da fé cristã e profissional em retórica . No entanto, a resposta parece estar em seu rigoroso ascetismo e exagerado conceito de santidade. Para Tertuliano a igreja deve se manter santa e incontaminada, e este conceito seria o cerne de sua teologia. Wiliston Walker (2006, p. 98) diz que observar as palavras de Deus, segundo Tertuliano, significa uma existência separada do mundo, o qual tinha o culto idólatra dos demônios. Maurice Nédoncelle (1905-1976), filósofo e teólogo francês, também observa que:
"Para ele (Tertuliano), heréticos e filósofos são uma coisa só: fazem as mesmas perguntas, exploram os mesmos domínios, perguntam-se de onde vem o mal, porque e de onde vem o homem, como é constituído o universo, etc. Eles respondem com o auxilio de princípios obscuros que acham peremptórios e que se reduzem a palavras pedantes e ridículas" (1958, p. 33).
Para não fazer injustiça a importância de Tertuliano na história do cristianismo, Norman Geisler (2002, p. 825-826), renomado apologista cristão, sai em sua defesa dizendo que Tertuliano é acusado falsamente de irracionalismo, e que apesar de sua forte influencia na fé, ele acreditava que havia um papel importante para a razão humana na defesa da religião cristã.
Karl Barth
Alister Macgrath (2005, p.260), professor de teologia histórica na Universidade de Oxford e um dos mais influentes pensadores cristãos da atualidade, sugere que a atitude mais negativa diante da interação cristianismo-filosofia, adotada na teologia cristã recente, tenha sido a de karl Barth. Porém, isto não quer dizer necessariamente que Barth fosse contra o estudo da filosofia , ou um antiintelectual. Barth na verdade por seu próprio mérito se veio a firmar-se como um grande intelectual. Sua crítica, no entanto, era contra o uso da filosofia e revelação natural como um ponto de contato (Anknüpfungspunkt) da revelação divina com a natureza humana para fins evangelísticos. Para Barth, Deus não precisa de nenhuma ajuda para tornar-se conhecido. Quanto a este assunto, ele diz:
"Deus não se dá a conhecer pelos poderes do conhecimento humano; só se pode apreendê-lo, e ele só se deixa apreender por causa de sua própria liberdade, decisão e ação" (BARTH apud MACGRATH, 2008, p.30).
A critica que se faz da teologia existencialista de Barth, pelo menos por parte dos apologistas-polemistas da fé cristã, é justamente o caráter fideista do sistema barthiniano. Francis Schaeffer (2007, p.43) em A morte da razão diz que no existencialismo religioso de Barth “não há lugar para a razão e nem ponto de verificação”. E segundo Alister Mcgrath, isto é um problema que se volta contra o próprio sistema neo-ortodoxo barthiniano. Ou seja, como a alegação de Barth é exclusivamente baseada na revelação divina, ela não pode ser avaliada senão por essa mesma revelação, desembocando necessariamente em um círculo vicioso. Em outras palavras, Mcgrath diz que “não existem pontos de referências externos, pelos quais as alegações da neo-ortodoxia possam ser verificadas” (2005, p.145).
Por Daniel Grubba no Soli Deo Gloria
quarta-feira, 7 de março de 2012
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